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CONCURSO PÚBLICO: RESTRIÇÕES E PRERROGATIVAS IMPOSTAS PELO ESTADO

Este mês tivemos uma importante decisão no campo das liberdades individuais com reflexo em ambiente administrativo. Cuida-se da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 898.450/SP, por meio da qual foi acolhida a seguinte tese em repercussão geral:

  1.  Os requisitos do edital para o ingresso em cargo, emprego ou função pública devem ter por fundamento lei em sentido formal e material.
  2.  Editais de concurso público não podem estabelecer restrição a pessoas com tatuagem, salvo situações excepcionais em razão de conteúdo que viole valores constitucionais.

O Ministro Luiz Fux, Relator do feito, fez registrar os seguintes argumentos:

O Estado não pode querer desempenhar o papel de adversário da liberdade de expressão, incumbindo-lhe, ao revés, assegurar que minorias possam se manifestar livremente, ainda que por imagens estampadas definitivamente em seus corpos. O direito de livremente se manifestar é condição mínima a ser observada em um Estado Democrático de Direito e exsurge como condição indispensável para que o cidadão possa desenvolver sua personalidade em seu meio social. A liberdade implica, no dizer de José Adércio Leite Sampaio, a não intromissão e o direito de escolha. Em relação à não intromissão, há um espaço individual sobre o qual o Estado não pode interferir, na medida em que representa um sentido afirmativo da personalidade. Nesse contexto, cada indivíduo tem o direito de preservar sua imagem como reflexo de sua identidade, ressoando indevido o desestímulo estatal à inclusão de tatuagens no corpo, o que ocorreria, caso fosse admitida como fator impeditivo à assunção de funções públicas.  



Nesta seara, falou mais alto a liberdade de expressão,  enquanto direito individual de se manifestar dentro da sociedade - paradigma maior de um Estado Democrático de Direito. Em todo caso, importa salientar que a liberdade de expressão acolhida pelo STF não significou, no caso vertente, o exercício de um direito aberto a qualquer tipo de expressão (no caso, de conteúdo), mas no direito maior de escolha da tradução do SER individual, passível de censura somente quando violar valores fundamentais constitucionalmente garantidos: a liberdade encontrando limite no exercício da liberdade dos demais. 

O único senão quanto à decisão fica por conta de o Poder Judiciário protagonizar diretrizes dessa ordem, fato que acabará por atrair para o próprio Judiciário, em inúmeras causas, o oferecimento de respostas para o que se deve ou não considerar como "valores constitucionais" a serem tutelados pelo Estado, ainda que estes estejam claros e a decisão tenha sido fruto de repercussão geral.

Vale conferir.

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