DA CONVERSÃO DA LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA EM PECÚNIA. DIREITOS ENVOLVIDOS (artigo atualizado em 2016)
Por Maria Lúcia Miranda Alvares[1]
Resumo:
O entendimento favorável à
conversão da licença-prêmio assiduidade em pecúnia por ocasião da ruptura do
vínculo jurídico do servidor público, mormente por ocasião da aposentadoria,
tem gerado insatisfações com respeito às teses acolhidas em relação à
prescrição do direito e da contagem em dobro para o fim de aposentadoria. Neste
trabalho a pretensão é trazer luzes ao debate diante dos posicionamentos
oficialmente adotados.
Palavras
chave: conversão em pecúnia,
licença-prêmio assiduidade; tempo de serviço, contagem em dobro, aposentadoria.
(I)
Da Contextualização do tema
É cediço o entendimento, tanto
em sede judicial, quanto em sede administrativa, em sentido favorável à conversão
em pecúnia da extinta licença-prêmio assiduidade não gozada, certamente por
opção do titular do direito[2].
A motivação administrativa
acolhida para consagrar o referido direito foi pautada, na essência, em
construção jurídica pretoriana, segunda a qual “Foge à razoabilidade jurídica que o servidor seja tolhido de receber a
compensação pelo não-exercício de um direito que incorporara ao seu patrimônio
funcional e, de outra parte, permitir que tal retribuição seja paga aos herdeiros,
no caso de morte do funcionário. Recurso não conhecido." (REsp
556.100/DF, 5ª Turma, Ministro Felix Fischer, DJU de 02/08/2004.)[3].
Não é demais lembrar que a
construção jurídica posta foi fruto do descompasso ocorrido por ocasião do
nascimento da própria Lei n° 8.112/90, cuja redação original trazia, no § 1°
do art. 87, a faculdade de conversão da licença-prêmio em pecúnia quando não
gozada pelo servidor e, no § 2°, a extensão desse direito em
favor dos beneficiários do servidor quando este viesse a falecer. Todavia, os
§§ 1° e 2° do art. 87 da Lei n° 8.112/90 foram vetados pela Presidência da
República, tendo o Congresso Nacional mantido, tão somente, o § 2°, que nada
mais era do que a sequência lógica do § 1°, fato que acabou por desencadear a exegese
acolhida, alicerçada no princípio da razoabilidade, haja vista o dispositivo legal
resultante desse embate legislativo. Ei-lo:
“Art. 87. Após cada qüinqüênio ininterrupto de exercício, o
servidor fará jus a 3 (três) meses de licença, a título de prêmio por
assiduidade, com a remuneração do cargo efetivo.
§ 1°
VETADO
§ 2° Os períodos de
licença-prêmio já adquiridos e não gozados pelo servidor que vier a falecer
serão convertidos em pecúnia, em favor de seus beneficiários da pensão.[4]
Mas é preciso dizer que o
entendimento atual não resultou de processo exegético manso e pacífico. Em
verdade, muitas foram as divergências suscitadas, mormente após a extinção da
licença-prêmio, em 1996, patrocinada pela Lei n° 9.527/97, decorrente da
conversão da Medida Provisória n° 1.595-14, de 10.11.1997, originária da Medida
Provisória n° 1.522, de 11.10.1996, que assim dispôs:
“Art. 7º Os períodos de licença-prêmio,
adquiridos na forma da Lei nº 8.112, de 1990, até 15 de outubro de 1996, poderão ser usufruídos ou contados em
dobro para efeito de aposentadoria ou convertidos em pecúnia no caso de
falecimento do servidor, observada a legislação em vigor até 15 de outubro de
1996.” (grifei)
Em ambiente administrativo a
tese era pela inviabilidade da conversão em pecúnia da licença-prêmio, salvo em
favor dos herdeiros do servidor, conforme ditava literalmente a legislação de
regência. Em sentido oposto se posicionaram os tribunais pátrios, fechando
orientação favorável à conversão da licença-prêmio em pecúnia não gozada como
direito do servidor. Assim sendo, a orientação judicial impulsionou o movimento
de mudança da interpretação em sede administrativa, que acabou por acolher a
conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada sob o escopo do dever de
reparação do Estado em face da impossibilidade do exercício do direito, pelo
servidor, na atividade[5].
Ainda quanto ao
entendimento acerca dos destinatários do direito à conversão, importante
registrar que não estão cobertos pela norma garantidora os servidores aposentados
sob a égide da Lei nº 1.711/52 e respectivos beneficiários, haja vista
a ausência de previsão, na citada norma, da possibilidade de conversão. Essa,
aliás, a orientação vigente junto ao Tribunal de Contas da União, in
verbis:
9.1. responder à Secretaria de Gestão de Pessoas deste Tribunal que:
9.1.1. o acórdão 1.980/2009-Plenário, alterado pelo acórdão 2.912/2010-Plenário, c/c o acórdão 3.263/2012-Plenário, que firmou entendimento
acerca do direito de conversão em pecúnia dos períodos de licença-prêmio por
assiduidade, não alcança os
aposentados pela Lei 1.711/1952 e seus herdeiros e pensionistas, por falta de
amparo legal;
[VOTO]
2. A Secretaria de Gestão de Pessoas (Segep) desta Corte indagou se o entendimento expresso no acórdão 1.980/2009-Plenário, que tratou do direito de conversão em pecúnia de períodos de licença-prêmio por assiduidade, alcança servidores aposentados sob a égide da Lei 1.711/1952 e herdeiros e pensionistas de servidores falecidos na vigência daquele diploma legal.
[VOTO]
2. A Secretaria de Gestão de Pessoas (Segep) desta Corte indagou se o entendimento expresso no acórdão 1.980/2009-Plenário, que tratou do direito de conversão em pecúnia de períodos de licença-prêmio por assiduidade, alcança servidores aposentados sob a égide da Lei 1.711/1952 e herdeiros e pensionistas de servidores falecidos na vigência daquele diploma legal.
[...]
9. Noto que toda a discussão havida, assim como os precedentes mencionados, tratou do direito à licença-prêmio adquirida e disciplinada pela Lei 8.112/1990. Só a partir da vigência daquele diploma legal é que se pode cogitar a possibilidade de conversão em pecúnia do benefício em questão.
9. Noto que toda a discussão havida, assim como os precedentes mencionados, tratou do direito à licença-prêmio adquirida e disciplinada pela Lei 8.112/1990. Só a partir da vigência daquele diploma legal é que se pode cogitar a possibilidade de conversão em pecúnia do benefício em questão.
10. A Lei
1.711/1952, por seu turno, não continha dispositivo que garantisse tal direito
nem ao servidor, nem a seus pensionistas, o que configura situação jurídica bem
distinta daquela verificada no âmbito da Lei 8.112/1990.
11. Vigora
no ordenamento jurídico nacional o princípio de que o tempo rege o fato. Ao
criar uma nova lei, o legislador pode disciplinar situações pretéritas, desde
que atendidos os seguintes requisitos: (i) expressa disposição nesse sentido; e
(ii) não violação, em decorrência da retroação da lei, de ato jurídico
perfeito, de coisa julgada e de direito adquirido.
12. De
forma geral, quando uma lei surge para regulamentar certa matéria, ela se
aplica aos fatos pendentes, especificamente às suas partes novas, e aos
futuros. No caso em exame, a Lei
8.112/1990 revogou a Lei 1.711/1952, mas não dispôs especificamente acerca da
aplicação de seus efeitos aos fatos consumados sob a égide do diploma legal
revogado.
13. A Lei
9.527/1997, que extinguiu a licença-prêmio e instituiu a
licença-capacitação, expressamente tratou dos períodos
de licença-prêmio que poderiam ser computados para fins de conversão em pecúnia em favor dos beneficiários:
“Art. 7º Os
períodos de licença-prêmio, adquiridos na forma da Lei
nº 8.112, de 1990, até 15 de outubro de 1996, poderão ser usufruídos ou
contados em dobro para efeito de aposentadoria ou convertidos em pecúnia no
caso de falecimento do servidor, observada a legislação em vigor até 15 de
outubro de 1996.
Parágrafo
único. Fica resguarda
do o direito ao cômputo do tempo de serviço residual para efeitos de concessão da licença capacitação." (grifo nosso)
do o direito ao cômputo do tempo de serviço residual para efeitos de concessão da licença capacitação." (grifo nosso)
14. O
principal argumento utilizado para concessão ao servidor do direito de conversão de licença-prêmio em
pecúnia foi o fato de haver, na Lei 8.112/1990, previsão para tal procedimento
em favor de eventual beneficiário de pensão. Tal premissa, entretanto, está
ausente da Lei 1.711/1952, razão pela qual conclui-se não ser possível estender
o entendimento do acórdão 1.980/2009-Plenário aos servidores
regidos pelo antigo Estatuto do Servidor Público Civil da União.
15.
Ademais, reitero que a Lei 9.527/1997 especificou a qual licença-prêmio se
referia: àquela adquirida na forma da Lei 8.112/1990. Não há dúvidas, pois,
quanto à matéria. (Acórdão TCU
nº 3.223/2014 – Plenário, os grifos não constam do original)
Pois bem. A par desse panorama,
que já parece velho, os efeitos do entendimento favorável à conversão em
pecúnia da licença-prêmio assiduidade não usufruída ainda suscitam insatisfações
por parte de servidores detentores do direito. Primeiro no tocante (i) à
prescrição adotada para requisitar a
conversão em pecúnia; e, por derradeiro, (ii) em relação ao entendimento
acolhido pelo Tribunal de Contas da União[6],
no sentido da inviabilidade de conversão em pecúnia da licença prêmio
assiduidade não gozada quando os respectivos períodos tenham sido utilizados
para contagem em dobro para aposentadoria e resultado na aferição do abono
de permanência, ainda que superado o tempo exigido para aposentação.
Esses dois aspectos relativos à
conversão em pecúnia da licença-prêmio assiduidade requisitam maiores digressões,
de modo que foram eleitos como objeto de estudo no presente ensaio.
(II) Da
Prescrição do direito à conversão da licença-prêmio em pecúnia
Consoante
foi dito, o entendimento acerca da viabilidade de conversão, em pecúnia, dos
períodos de licença-prêmio não gozada pelo servidor na atividade foi objeto de
longas divergências, mormente em sede administrativa.
A
insatisfação dos servidores pela negativa do direito no âmbito da Administração
Pública foi levada ao Poder Judiciário que, por sua vez, passou a consolidar
entendimento favorável a tese, vindo a impulsionar, desta feita, as orientações
administrativas.
Assim,
em
sede administrativa, muitos foram os marcos temporais de reconhecimento
do direito à conversão, de modo a fomentar dúvida ou incerteza com relação à
data de início de contagem do prazo prescricional para tal finalidade. Sim,
porque a prescrição – por meio da qual se extingue a pretensão ao direito pelo
seu não exercício no prazo estabelecido em lei[7] - tem início no momento em que o servidor passa
a deter o direito de exercer essa pretensão, a exigir o conhecimento desse
marco inicial.
O Tribunal de Contas da União
firmou entendimento inicial, em sede administrativa, no sentido de que
o início da prescrição de direito para conversão em pecúnia da licença-prêmio
não gozada seria a data da aposentadoria do servidor. Eis o teor do julgado:
“ADMINISTRATIVO. REQUERIMENTO
FORMULADO POR SERVIDOR APOSENTADO DO TCU. LICENÇA-PRÊMIO. CONVERSÃO EM PECÚNIA
DOS PERÍODOS NÃO-GOZADOS E NEM COMPUTADOS EM DOBRO PARA FINS DE APOSENTADORIA.
POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL.
DATA DA APOSENTADORIA. DEFERIMENTO. DETERMINAÇÃO. RESTITUIÇÃO À UNIDADE
COMPETENTE.
1. É possível a conversão em pecúnia dos períodos de
licença-prêmio não-gozados e nem computados em dobro para fins de aposentadoria
em benefício do servidor aposentado. Precedentes.
2. Nos casos de pedido de conversão em pecúnia de licença-prêmio
não gozada nem computada em dobro para fins de aposentadoria, o termo inicial do prazo prescricional de 5
(cinco) anos é data da respectiva aposentadoria do servidor. (Acórdão TCU Plenário n°
1980/2009[8] – os grifos não constam do
original)
Posteriormente, em 2012, o Tribunal de Contas da União retomou a
discussão acerca da matéria e firmou tese, consubstanciada no Acórdão TCU nº
3.263/2012 - Plenário, no sentido de que o marco inicial da prescrição seria aquele
em que o Tribunal firmou entendimento favorável à conversão em pecúnia da
licença-prêmio - momento em que foi possível ao servidor aposentado exercer a
sua pretensão. A diretriz consagrada
pelo Tribunal de Contas foi renovada pelo Acórdão TCU nº 3.223/2014
- Plenário, que fez consignar os seguintes elementos adicionais:
9.1.
responder à Secretaria de Gestão de Pessoas deste Tribunal que:
[...]
9.1.2. é possível a concessão tardia da conversão em pecúnia da licença-prêmio, ainda que decorridos mais de cinco anos da aposentadoria, a servidores aposentados pela Lei 8.112/1990, desde que, para a respectiva solicitação, tenham sido implementados os requisitos para essas concessões e tenha sido observado o prazo prescricional previsto no acórdão 3.263/2012-Plenário, ou seja, cinco anos contados de 04/09/2009, data da publicação do acórdão 1.980/2009-Plenário; e
9.1.2. é possível a concessão tardia da conversão em pecúnia da licença-prêmio, ainda que decorridos mais de cinco anos da aposentadoria, a servidores aposentados pela Lei 8.112/1990, desde que, para a respectiva solicitação, tenham sido implementados os requisitos para essas concessões e tenha sido observado o prazo prescricional previsto no acórdão 3.263/2012-Plenário, ou seja, cinco anos contados de 04/09/2009, data da publicação do acórdão 1.980/2009-Plenário; e
[VOTO]
7. Ao iniciar o exame do assunto, destaco que a discussão travada nos pareceres e votos que precederam o acórdão 1.980/2009-Plenário se deu em torno dos vetos presidenciais aos parágrafos do art. 87 da Lei 8.112/1990, dos quais somente o veto ao § 2º foi posteriormente derrubado pelo Congresso Nacional:
7. Ao iniciar o exame do assunto, destaco que a discussão travada nos pareceres e votos que precederam o acórdão 1.980/2009-Plenário se deu em torno dos vetos presidenciais aos parágrafos do art. 87 da Lei 8.112/1990, dos quais somente o veto ao § 2º foi posteriormente derrubado pelo Congresso Nacional:
[...]
§ 2º Os períodos de licença-prêmio já adquiridos e não gozados pelo servidor que vier a falecer serão convertidos em pecúnia, em favor de seus beneficiários da pensão."
§ 2º Os períodos de licença-prêmio já adquiridos e não gozados pelo servidor que vier a falecer serão convertidos em pecúnia, em favor de seus beneficiários da pensão."
[...]
10. Entendo, entretanto, que não seja o caso de se falar em enriquecimento sem causa da Administração, mas sim de reconhecer que a impossibilidade da conversão em pecúnia de um direito que o servidor incorporou ao seu patrimônio jurídico fere o princípio da razoabilidade, quando, em relação a esse mesmo direito, é admitida a conversão em pecúnia em favor dos beneficiários de pensão do servidor. (grifei)
[...]
17. Resta enfrentar a segunda dúvida da Segep, relativa ao direito à concessão tardia e consequente conversão em pecúnia de períodos nem usufruídos, nem contados em dobro para aposentadoria, ainda que decorridos mais de 5 (cinco) anos da aposentadoria, daqueles que não solicitaram oficialmente a concessão dos quinquênios da licença à época, mas que implementaram os requisitos para tal concessão.
18. Observo que implementadas as condições legais para usufruto de direito legalmente instituído, este é incorporado ao patrimônio do servidor, independentemente de sua solicitação ou não, pois a lei não estipulou que tal direito só se aperfeiçoaria com tal pedido. Assim, endosso a conclusão da Segedam acerca da possibilidade de reconhecer o direito à concessão tardia, sob a égide da Lei 8.112/1990, ainda que decorridos mais de cinco anos da aposentadoria, desde que implementados os requisitos para essas concessões e observado o prazo prescricional previsto no acórdão 3.263/2012-Plenário, ou seja, cinco anos contados da data da publicação do acórdão 1.980/2009-Plenário (04/09/2014), para solicitação oficial da conversão em pecúnia da licença-prêmio. (Acórdão TCU nº 3.223/2014 – Plenário –os grifos não constam do original)
10. Entendo, entretanto, que não seja o caso de se falar em enriquecimento sem causa da Administração, mas sim de reconhecer que a impossibilidade da conversão em pecúnia de um direito que o servidor incorporou ao seu patrimônio jurídico fere o princípio da razoabilidade, quando, em relação a esse mesmo direito, é admitida a conversão em pecúnia em favor dos beneficiários de pensão do servidor. (grifei)
[...]
17. Resta enfrentar a segunda dúvida da Segep, relativa ao direito à concessão tardia e consequente conversão em pecúnia de períodos nem usufruídos, nem contados em dobro para aposentadoria, ainda que decorridos mais de 5 (cinco) anos da aposentadoria, daqueles que não solicitaram oficialmente a concessão dos quinquênios da licença à época, mas que implementaram os requisitos para tal concessão.
18. Observo que implementadas as condições legais para usufruto de direito legalmente instituído, este é incorporado ao patrimônio do servidor, independentemente de sua solicitação ou não, pois a lei não estipulou que tal direito só se aperfeiçoaria com tal pedido. Assim, endosso a conclusão da Segedam acerca da possibilidade de reconhecer o direito à concessão tardia, sob a égide da Lei 8.112/1990, ainda que decorridos mais de cinco anos da aposentadoria, desde que implementados os requisitos para essas concessões e observado o prazo prescricional previsto no acórdão 3.263/2012-Plenário, ou seja, cinco anos contados da data da publicação do acórdão 1.980/2009-Plenário (04/09/2014), para solicitação oficial da conversão em pecúnia da licença-prêmio. (Acórdão TCU nº 3.223/2014 – Plenário –os grifos não constam do original)
O Supremo Tribunal Federal, nos autos do Processo Administrativo
n° 331.583/2008[9], cuja decisão serviu de
paradigma para revisão da matéria pelo Tribunal de Contas da União, firmou tese
no sentido de que o início do prazo prescricional para os servidores aposentados
detentores do direito junto àquela Suprema Corte seria a data de 21 de
setembro de 2011 - data da sessão em que o Supremo Tribunal Federal
autorizou, em sede administrativa, a conversão em pecúnia da licença-prêmio não
usufruída e nem computada para efeito de aposentadoria. Igual exegese foi
adotada pelo Superior Tribunal de Justiça no MS nº 17.406/DF.
A par das decisões colhidas,
fácil é vislumbrar que a questão não é tão simples quanto parece. Em primeiro
lugar, como foi registrado alhures, se a matéria era controvertida em ambiente
administrativo, não haveria espaço para se fixar o marco inicial do prazo
prescricional. Ou melhor, não se poderia invocar a presença de uma situação
jurídica consolidada capaz de estabelecer o ponto de partida para
propositura de ação ou impugnação pelo detentor do direito, pelo menos para os
que já haviam satisfeito todas as condições, assim considerados os que já
haviam rompido o vínculo jurídico com a Administração. Na verdade,
a inércia do titular do direito decorria, justamente, do entendimento jurídico
desfavorável à pretensão, de modo que não se poderia falar, desta feita, em
titularidade do direito, haja vista que este nem ao menos era acolhido enquanto
tal pela própria Administração. E qual seria a solução? Sem dúvida, perquirir
acerca do estabelecimento do marco fundamental do direito, do
momento em que o órgão/ente passou a admiti-lo.
Nesse contexto, se a conversão
da licença-prêmio não gozada em pecúnia é direito que foi estabelecido em momentos
diferentes por vários órgãos, é a partir desses momentos que nasce a situação
jurídica fundamental impulsionadora do direito do servidor em reclamar
ou pleitear a respectiva satisfação dentro do qüinqüênio previsto no art. 1° do
Decreto n° 20.910/32, a se consolidar, na hipótese de a decisão decorrer de
órgãos sem poder de vinculação administrativa, mediante a uniformização da situação
jurídica fundamental pelo órgão de cúpula. Em outras palavras, se o órgão
a que se encontra vinculado o servidor, por força de sua competência, veio a
estabelecer o direito à conversão a partir de determinado momento, pondo fim à
controvérsia antes existente, é a partir desse momento que surge o marco
inicial da contagem do prazo prescricional, a exemplo dos prazos fixados pelo
Tribunal de Contas da União (4/9/2009[10]) e pelo Supremo Tribunal Federal (21/9/2011[11]), ambos em favor dos servidores aposentados que
implementaram as condições para o usufruto da vantagem e dela não gozaram na
atividade.
Em suma, a prescrição do direito
à conversão da licença-prêmio não gozada em pecúnia, para o servidor aposentado,
deve ter início na data em que o órgão, em sede administrativa, uniformizou
e fixou entendimento favorável à tese, cabendo ressaltar, por lógico,
que os servidores titulares do direito à licença-prêmio que ainda mantém vínculo
jurídico com a Administração e, portanto, ainda estão na atividade, o
prazo prescricional deve ser computado do momento da ruptura do vínculo, seja
por força de aposentadoria, exoneração ou falecimento, momento em que o servidor não mais poderá usufruir do benefício, conforme deixou assente o Ministro Dias Tofolli no MS 27.011/DF.
Importante repisar, mais uma vez, que o marco
fundamental da prescrição acolhido pelo TCU (4/9/2009) e pelo STF
(21/9/2011) o foi para os servidores aposentados. Ou seja,
para aqueles que satisfizeram as condições para o usufruto do direito, assim
considerados os que não gozaram da licença-prêmio na atividade e não a
utilizaram para ao cômputo de tempo da aposentadoria. Para os servidores que
estão em vias de se aposentar e que possuem períodos de licença-prêmio não
gozados, a pretensão do direito somente é satisfeita com a ruptura do vínculo e,
como tal, o início do prazo prescricional para esses servidores continua sendo
a data de sua aposentadoria ou da extinção do vínculo, eis que a pretensão da
conversão em pecúnia somente ocorrerá nesse momento.
(III) Do
direito à conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada quando utilizada
para contagem em dobro para aposentadoria e consequente aquisição do direito ao
abono de permanência.
Sobre
o tema é preciso dizer que o Tribunal de Contas da União, em grau de consulta e
com efeito normativo, firmou entendimento no seguinte sentido – objeto do Acórdão
1.342/2011 - Plenário:
CONSULTA. IMPOSSIBILIDADE DE REVERSÃO DE OPÇÃO FEITA POR
SERVIDOR PELA CONTAGEM EM DOBRO DE PERÍODO DE LICENÇA-PRÊMIO, PARA FINS DE
APOSENTADORIA, PARA CONVERSÃO EM PECÚNIA.
1. A opção
formal do servidor pela contagem em dobro de período de licença-prêmio, para
efeito de aposentadoria, é irretratável, conforme Decisão nº 981/2001-Plenário.
2. Não é possível a conversão, em pecúnia, por ocasião da
aposentadoria, dos dias de licença-prêmio por assiduidade computados em dobro,
mediante opção irretratável, para a concessão do abono de permanência, de que
trata o art. 40, § 19, da Constituição Federal de 1988, bem assim os arts. 2º,
§ 5º, e 3º, §1º, da Emenda Constitucional nº 41.
A tese acolhida pelo Tribunal de Contas da
União esposou, dentre outros, os seguintes fundamentos:
“Pelo mesmo motivo, a opção pela contagem em dobro de período de
licença-prêmio para efeito de percepção
de abono permanência é irretratável, pois não há direito ao referido abono se
não houver o correspondente direito à aposentadoria.
Isto porque com aquela opção manifestada pelo impetrante, restou formalizado o direito adquirido do
servidor não só à percepção do abono de permanência, mas também a sua
aposentadoria, cujo requerimento pode ser apresentado pelo impetrante a
qualquer momento, pois decorrente de um ato jurídico definitivamente
constituído.
Ademais, o direito resultante do tempo de contribuição averbado pela Administração incorporou-se
no patrimônio do servidor e produziu os efeitos jurídicos decorrentes."
A desconstituição de atos
jurídicos perfeitos, com efeitos produzidos e em produção, por iniciativa
exclusiva do servidor, no seu exclusivo interesse, motivada pela vantajosidade
de se retornar ao status quo ante e, a partir dali, tomar novas decisões
fundadas na quantificação do benefício financeiro propiciado pela aplicação
retroativa de novo entendimento dos Tribunais fere o princípio da segurança
jurídica, em sua dimensão objetiva. E se fosse tal hipótese cogitada em
favor da Administração seria rechaçada com toda a força da doutrina e da
jurisprudência dominantes por malferir o mesmo princípio da segurança jurídica,
agora em sua dimensão subjetiva, a da boa-fé e confiança nos atos emanados do
Estado.
Admitir tal possibilidade implicaria, também, submeter a
Administração a permanente possibilidade de sofrer sobressaltos financeiros e
ônus operacionais, situação indesejável frente a um dos princípios reitores da
Administração Pública, o da eficiência.” (os grifos não constam do original)
Confessa vênia, verifica-se
que a tese deixa a desejar em muitos aspectos. Institutos jurídicos foram
tratados como opções irreversíveis - como foi o caso da averbação e da própria
aposentadoria -, assim como outros tiveram desvirtuados os seus supostos de
fato, a exemplo do abono de permanência e da reversão, dando ensejo a uma
genérica confusão da natureza jurídica imanente a cada qual.
A saber:
Em primeiro lugar, é preciso
dizer que a averbação de tempo de serviço nada mais é do que o registro, nos
assentamentos funcionais do servidor, do lapso de tempo de serviço/contribuição
prestado em determinado ente/órgão, público ou privado, comprovado nos termos
da lei, junto ao órgão ou ente em que se pretende alcançar os efeitos jurídicos
a que se destinam.
É em face da averbação do
tempo de serviço que se verifica se o servidor preencheu, por exemplo, o tempo
requisitado para aposentadoria ou para outros efeitos legais, estes últimos
quase inexistentes em sede federal[12].
Nesse sentido, a contagem em dobro da licença-prêmio assiduidade não gozada é
um efeito
jurídico
da averbação do tempo de serviço público, assim como o é a própria
aposentadoria[13].
A par dessa orientação, se o servidor
satisfez, em face do registro do tempo em seus assentamentos funcionais, as
condições prescritas para a aposentadoria, estará, desta feita, apto a
requisitar o respectivo direito. Ou alternativamente, optar em permanecer na
atividade. Se permanecer da atividade, terá jus ao abono de permanência,
correspondente a um acréscimo pecuniário, equivalente ao valor da contribuição
previdenciária.
Evidencia-se, portanto, que
o direito ao abono possui um fato gerador – que é a opção pela permanência na
atividade do servidor que implementou as condições para inativação.
Esta, a opção, pode ser realizada algum tempo depois de preenchido os
requisitos para a aposentadoria, mas os seus efeitos retroagem ao momento do
implemento das condições. Assim, não importa se o direito à aposentadoria teve
origem ou foi antecipado com a contagem em dobro da licença-prêmio assiduidade
não gozada, o que importa é que o servidor, tendo satisfeito as condições para
a aposentação, naquele momento, dele não se utilizou, permanecendo na atividade.
O importante é que formalize essa opção.
Nesse patamar de funcionalidade, fácil é
perceber que o recebimento do abono de permanência não tem o condão de
obstaculizar o servidor de se aposentar por regra diversa daquela em que,
inicialmente, lhe conferiu direito ao usufruto do benefício. E isso ocorre
porque o tempo não para. O tempo passa, as situações constituídas se
transformam e nascem outros direitos pelo decurso do tempo.
Sob tal perspectiva,
mantendo-se o servidor na atividade, por opção, o tempo de licença registrado e
contado em dobro para aposentadoria em um determinado momento é liberado
pelo decurso
de tempo suficiente para abarcar outra hipótese/regra de inativação.
Veja que até aqui o direito à aposentadoria não foi consumado, o servidor
permanece na atividade, gozando, portanto, tanto do direito ao abono, como do
direito de usufruir de outro tipo de aposentadoria, esta sem requisitar a
contagem em dobro da licença-prêmio não gozada.
Desta forma, por lógico, se
o servidor, ao optar pela aposentadoria, não precisou computar em dobro o tempo
de licença-prêmio assiduidade, ainda que outrora tenha esse tempo lhe
franqueado o direito de antecipar o preenchimento das
condições exigidas para a inativação, fará jus à indenização correspondente ao
referido período, pois dela não se utilizou no momento da inativação. E
isso é possível porque o fato gerador do abono de permanência – que é a opção
em permanecer na atividade – não se confunde com o fato gerador da aposentadoria
– traduzido pelo implemento das condições previstas em lei para o usufruto do
direito, este sempre dinâmico. Aliás, a exegese encontra ressonância no Acórdão
proferido pela Sétima Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª
Região, assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO. SERVIDOR
PÚBLICO. LICENÇA-PRÊMIO. CONVERSÃO EM PECÚNIA. APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE.
imposto de renda.
I. O artigo 7º, da Lei nº 9.527/97, dispõe que os períodos de
licença-prêmio, adquiridos na forma da Lei nº 8.112, de 1990, até 15 de outubro
de 1996, poderão ser usufruídos ou contados em dobro para efeito de
aposentadoria ou convertidos em pecúnia no caso de falecimento do servidor.
II. Não vislumbro, portanto, que tenhamos que adotar uma interpretação
restritiva da mesma, negando ao servidor inativo que não veio a utilizar-se do
direito à fruição da licença ou a sua conversão em dobro para fins de
aposentadoria a possibilidade de converter em pecúnia os dias de efetivo
exercício em excesso.
III. Nesse sentido, verifica-se que o Autor, de fato, faz jus à
indenização proveniente do período mencionado, perfazendo o total de 1 (um) ano
e 6 (seis) meses de licença prêmio, sendo o período efetivamente reconhecido
pela Administração Pública, conforme se infere do mapa de tempo de serviço.
IV. Outrossim, não merece
prosperar o argumento trazido à baila na sentença de piso, no sentido de o
Autor ter sido beneficiado pelo cômputo em dobro para a contagem do tempo de
aposentadoria, já que o tempo de serviço, por si só, já era por demais
suficiente a aposentadoria. Vale
dizer, como o Autor já possuía tempo de serviço necessário para a aposentação,
não seria necessária a utilização deste período para a contagem em dobro.
V. Por fim, frise-se que não sendo a
conversão de licença-prêmio em pecúnia fato gerador de imposto de renda, mas
somente indenização por ter deixado de usufruir de direitos incorporados ao seu
patrimônio, não se afigura legítima a incidência do imposto.
VI. Agravo Interno improvido. (TRF
2ª Região, Rel. desembargador Federal Reis FRiede, E-DJF2R - Data::14/07/2010 -
Página::159. O grifo não consta do original)
Por outro lado, merece ser
dito que a opção do servidor em permanecer na atividade não é ato irretratável
ou irrenunciável, assim como não o é a opção pela própria aposentadoria, e,
quiçá, a contagem de tempo de serviço, sempre acessória desses direitos. A
faculdade para usufruir de tais benefícios é franqueada ao servidor,
logicamente com os percalços estabelecidos na legislação de regência.
No caso da intitulada
desaposentação ou da renúncia à aposentadoria, já se manifestou o Superior
Tribunal de Justiça do sentido de sua viabilidade, inclusive com a
possibilidade de utilização do tempo já averbado para fazer face à concessão
de novo benefício[14]. Eis o teor de alguns
julgados[15]:
AGRAVO
REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. DIREITO DE RENÚNCIA. CABIMENTO.
POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA NOVA
APOSENTADORIA. NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS PELO INSS. FALTA DE
INTERESSE.
1.
Esta Corte firmou compreensão de que a aposentadoria, direito patrimonial
disponível, pode ser objeto de renúncia, revelando-se possível, nesses casos, a
contagem do respectivo tempo de serviço para a obtenção de nova
aposentadoria, ainda que por outro regime de previdência.
2.
No que tange à restituição dos valores pagos pelo INSS a título de
aposentadoria, o Tribunal decidiu no mesmo sentido do pleito recursal,
mostrando-se evidente a falta de interesse em recorrer quanto ao tema.
3.
Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1232336/SC, Rel. Ministro Haroldo
Rodrigues (Desembargador Convocado do TJ/CE), Sexta Turma, julgado em
05/04/2011, DJe 16/05/2011) (o grifo não consta do original)
AGRAVO
REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL.
RENÚNCIA. POSSIBILIDADE.
1.
É firme a compreensão desta Corte Superior de Justiça que, sendo a
aposentadoria direito patrimonial disponível, é cabível a renúncia a
tal benefício, não havendo, ainda, impedimento para que o segurado que continue
a contribuir para o sistema formule novo pedido de aposentação que lhe seja
mais vantajoso. Precedentes.
2.
Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1121427/SC, Rel.
Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 23/11/2010, DJe 13/12/2010) (o
grifo não consta do original)
“PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA À
APOSENTADORIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE.
1. A renúncia à
aposentadoria, para fins de aproveitamento do tempo de contribuição e concessão
de novo benefício, seja no mesmo regime ou em regime diverso, não importa em
devolução dos valores percebidos, "pois enquanto perdurou a aposentadoria
pelo regime geral, os pagamentos, de natureza alimentar, eram indiscutivelmente
devidos"
(REsp 692.628/DF, Sexta Turma,
Relator o Ministro Nilson Naves, DJU de 5.9.2005). Precedentes de ambas
as Turmas componentes da Terceira Seção.
2. Recurso especial provido.” (REsp 1113682/SC, Rel.
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Jorge Mussi,
Quinta Turma, julgado em 23/02/2010, DJe 26/04/2010)(o grifo não consta do original)[16]
O Tribunal de Contas da
União também já se posicionou em sentido favorável à viabilidade jurídica de
renúncia à aposentadoria, conforme se vislumbra na decisão do Acórdão n°
2305/2015 - Plenário. A saber:
A possibilidade de renúncia de
inativação anterior, para contar o tempo de serviço nela empregado em nova aposentadoria,
é questão já pacificada, consoante reiterados precedentes do TCU e do Superior
Tribunal de Justiça. A propósito, cito os seguintes: STJ: ROMS 17.874-MG, 5ª
Turma, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, julgado em Sessão de
16/12/2004; MS 7.711-DF, 3ª Seção, Relator Ministro Paulo Gallotti, julgado em
Sessão de 8/5/2002; AgRg no REsp 497.683-PE, 5ª Turma, Relator Ministro Gilson
Dipp, julgado em Sessão de 17/6/2003; e REsp 692.628-DF, 6ª Turma, Relator
Ministro Nilson Naves, julgado em Sessão de 17/5/2005.
A ementa do ROMS 17.874-MG é cristalina no seguinte sentido: "A aposentadoria é direito patrimonial disponível, sujeita à renúncia, possibilitando à recorrente a contagem do respectivo tempo de serviço e o exercício em outro cargo público para o qual prestou concurso público."
Este Tribunal já apreciou processos contendo pedidos de renúncia de aposentadoria para fins de averbação do tempo de serviço para nova inativação. Nestes casos, justamente por se tratar de manifestação definitiva, o Colegiado competente sempre determina o cancelamento do registro do ato de aposentadoria, devendo a Sefip proceder às devidas anotações e ao órgão de origem que proceda ao acerto de contas, com vistas ao ressarcimento de valores eventualmente recebidos a maior dos cofres públicos pelo interessado, de acordo com o artigo 46 da Lei 8.112/90 (cf. Acórdão 885/2003 - Primeira Câmara, Ata 14/03, TC 007.747/1994-6 e Acórdão 317/2003 - Segunda Câmara, Ata 07/03,TC 016.211/2002-2). (os grifos não constam do original)
A ementa do ROMS 17.874-MG é cristalina no seguinte sentido: "A aposentadoria é direito patrimonial disponível, sujeita à renúncia, possibilitando à recorrente a contagem do respectivo tempo de serviço e o exercício em outro cargo público para o qual prestou concurso público."
Este Tribunal já apreciou processos contendo pedidos de renúncia de aposentadoria para fins de averbação do tempo de serviço para nova inativação. Nestes casos, justamente por se tratar de manifestação definitiva, o Colegiado competente sempre determina o cancelamento do registro do ato de aposentadoria, devendo a Sefip proceder às devidas anotações e ao órgão de origem que proceda ao acerto de contas, com vistas ao ressarcimento de valores eventualmente recebidos a maior dos cofres públicos pelo interessado, de acordo com o artigo 46 da Lei 8.112/90 (cf. Acórdão 885/2003 - Primeira Câmara, Ata 14/03, TC 007.747/1994-6 e Acórdão 317/2003 - Segunda Câmara, Ata 07/03,TC 016.211/2002-2). (os grifos não constam do original)
Nesse sentido, fica evidenciado que a
aposentadoria é direito disponível, assim como a opção do servidor em permanecer
na atividade. Do mesmo modo, é visível que o tempo que confere guarida à
aposentadoria é dinâmico pela passagem do tempo, passível de constituir novas
formas de aposentação, inclusive para além da renúncia, em prol de benefício
mais vantajoso.
O que não é disponível é o ato de
renúncia à aposentadoria, este sim irretratável diante da situação constituída.
E, por
assim ser, é vedado imprimir a esse ato efeitos retroativos, ou
melhor, aproveita-se o tempo anterior para nova aposentadoria, porém, com base
nas regras
vigentes no momento do novo pedido.
Nesses termos, fica evidente
que o direito ao abono de permanência diz respeito à opção do servidor, detentor
do direito à aposentação, em permanecer na atividade. E este é
um direito disponível. A contagem em dobro do período de licença-prêmio não
gozada para o fim de aposentadoria é direito que se agrega ao tempo e
viabiliza o preenchimento das condições previstas em lei para a concessão de
aposentadoria, mas não se confunde com o suposto de fato do abono de
permanência, pautado na opção de permanência do titular do
direito à inativação.
Melhor esclarecendo: a
utilização dos períodos de licença-prêmio não gozada para o fim de contagem em
dobro para aposentadoria ainda que consubstancie direito disponível, não
consolida situação irreversível, irretratável pela opção do titular em face da
concessão do abono de permanência. E isso é visível pelo simples fato de que o
que vincula o direito ao abono é a condição fática subjacente ao direito de
inativação, ou melhor, é a possibilidade efetiva de o servidor
optar ou não por se aposentar a qualquer momento, pois reúne as condições
exigidas para se inativar. Exemplificando: servidor que implementa condições
para a aposentação mediante a contagem em dobro de períodos de licença-prêmio
não gozada, ainda que não autorize o respectivo cômputo
para tal fim, terá reunido as condições para inativação e poderá delas dispor a
qualquer momento, de forma que pelo simples fato de não autorizar o cômputo
do tempo já está optando em permanecer na atividade, tendo jus ao abono.
(IV) CONCLUSÃO
Isto posto, data
vênia do entendimento exarado pela Corte de Contas, não se encontra óbice à
conversão em pecúnia dos períodos de licença-prêmio assiduidade não gozada
quando esses períodos não foram levados a efeito para a efetiva concessão da
aposentadoria do servidor, ainda que antes tenham sido utilizados para atestar
o preenchimento das condições de aposentação e lhe conferido o direito de optar
em permanecer na atividade, com usufruto do abono de permanência.[17]
E, ainda se vai mais além,
liberado os períodos de licença-prêmio pelo decurso do tempo e implemento do direito
de usufruto de aposentadoria por outras regras, pode o servidor optar até mesmo
por usufruir, na atividade, da própria licença.
De qualquer forma, para os
que já haviam satisfeito as condições e se aposentaram sem a devida indenização
da licença-prêmio não gozada, nos moldes acima retratados, caberá o direito à
indenização, observado o prazo prescricional, que deve ser contado a partir
data em que o órgão, em sede administrativa, uniformizou entendimento favorável
à tese[18].
Para os que ainda não se aposentaram e não gozaram na licença-prêmio na
atividade, a pretensão à indenização surge por ocasião da aposentadoria[19].
Artigo
atualizado em 30/1/2016
[1]
Pós-Graduada em Direito Administrativo /UFPA, autora do livro Regime Próprio
de Previdência Social. Editora NDJ, e colaboradora de revistas jurídicas na
área do Direito Administrativo. Artigo escrito em 15 de março de 2012.
[3] O Tribunal de Contas da União trouxe outra motivação,
assentada no Acórdão nº
1.980/2009-Plenário: “à despeito da ausência
de previsão legal, tal óbice foi superado, uma vez que, a teor do § 2º acima
transcrito, ‘a própria lei admite sua conversão em favor dos beneficiários da
respectiva pensão’. Admitir a conversão em pecúnia em favor dos beneficiários
de pensão do servidor, ‘e não àquele que as conquistou’, impossibilitando o exercício de um direito
que o servidor incorporou ao seu patrimônio jurídico, além de fugir ‘àquela
noção elementar de justiça’, já que impede o exercício por seu titular, somente
por uma questão temporal, não gera economia, pois, 'excetuando-se o caso de o
servidor não instituir pensão, o que não é regra, a Administração só estará
postergando a despesa’. (Acórdão
TCU nº 3223/2014 – Plenário, Ata nº 46/2014, grifos do original)
[4]
Importa dizer que o veto teve
por fundamento a elevação da despesa no ano de 1991, considerando que o mesmo
diploma legal possibilitava a contagem retroativa do tempo de serviço dos
servidores celetistas, cujos empregos foram transformados em cargos efetivos.
[5]
Cabe referir que, por força do entendimento consolidado, não precisa o servidor demonstrar
que lhe foi impossível o usufruto da licença, eis que é presunção
dessa inviabilidade a própria existência de licença não gozada. Ou
seja, se o servidor não gozou da licença em atividade é porque houve,
certamente, interesse da Administração para que permanecesse na atividade
(nesse sentido inúmeros julgados, inclusive do STJ). O TCU também comunga de
igual entendimento, conforme se vislumbra do teor dos acórdãos citados neste
ensaio.
[6]
Acórdão TCU n° 1342/2011 – Plenário.
[7] A prescrição contra a Fazenda Pública é regulada pelo
Decreto 20.910/1932, que assim dispõe: “Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos
Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal,
estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se
originarem. Art. 2º Prescrevem igualmente no mesmo prazo todo o
direito e as prestações correspondentes a pensões vencidas ou por vencerem, ao
meio soldo e ao montepio civil e militar ou a quaisquer restituições ou diferenças.
”
[8]
Por intermédio do Acórdão
2.912/2010-Plenário, “reconheceu-se a
interrupção do referido prazo prescricional em razão de comunicação expedida em
22/8/2005 pela Secretaria de Recursos Humanos do Tribunal (Serec), garantindo o
direito em comento àqueles que se
aposentaram após 22/8/2000”. (excerto explicativo extraído do
Acórdão 3263/2012 – TCU-Plenário)
[9]
v.
Atas das sessões do STF nos dias 21 de setembro de 2011 e 15 de fevereiro de
2012.
[10]
Que findou em 4/9/2014.
[11]
A findar em 21/9/2016.
[12] A maioria dos
direitos dantes devidos ao servidor foram extintos, tais como: adicional por
tempo de serviço, quintos, licença-prêmio e outros.
[14]
A matéria está em debate no STF, tendo sido acolhida Repercussão Geral no RE
661.256/SC. Ainda sobre o tema o STF analisa os RE 827833/SC e o RE 381367/RS.
(v. Informativo 765/STF)
[15]
Fonte dos
julgados: JUNIOR, Julio José Araujo. Mais algumas
reflexões sobre a desaposentação. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n.
3157, 22 fev. 2012. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/21126>.
Acesso em: 4 mar. 2012.
[16] No mesmo
sentido, outro julgado mais recente: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. INAPLICABILIDADE
DO PRAZO DECADENCIAL DE REVISÃO DE BENEFÍCIO AO CASO DE DESAPOSENTAÇÃO (ART.
543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).Não é possível aplicar o prazo decadencial
decenal previsto no art. 103 da Lei 8.213/1991 aos casos de desaposentação. Com
efeito, o referido dispositivo legal dispõe ser de dez anos o prazo para a
revisão de ato de concessão ou de indeferimento de benefício, não sendo
aplicável ao caso de desaposentação, que indica o exercício do direito de
renúncia ao benefício em manutenção a fim de desconstituir o ato original e,
por conseguinte, obter uma nova aposentadoria, incrementada com as
contribuições vertidas pelo segurado após o primeiro jubilamento.
Nesse contexto, vale lembrar que a instituição desse prazo decadencial no
direito previdenciário foi uma inovação que limitou a revisão dos critérios
adotados para o cálculo da renda mensal inicial, que, até então, poderia
acontecer a qualquer tempo. A interpretação a ser dada ao instituto da
decadência previsto no art. 103 da Lei 8.213/1991 deve ser restritiva, haja
vista que as hipóteses de decadência decorrem de lei ou de ato convencional,
inexistentes para a hipótese ora tratada. REsp 1.348.301-SC, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima,
julgado em 27/11/2013. (grifo nosso) Fonte: Informativo STJ nº 0535, de 14
de março de 2014.
[17]
Tese também adotada em nosso livro “Regime Próprio de Previdência Social”. São
Paulo, Ed. NDJ, 2007.
[18]
No âmbito federal, a maioria das decisões favoráveis à conversão ocorreu entre 2009/2010. Sobre o tema ver PARECER/MP/CONJUR/SMM/Nº 1654 - 3.16 / 2009. No Judiciário o prazo de prescrição para os aposentados findará em 21 de setembro de 2016.
[19]
É preciso lembrar que os servidores que estão na ativa a prescrição tem início
com a data de vigência de sua aposentadoria.
Diversamente dos aposentados, cuja data marco de início do prazo
prescricional é aquela reconhecida pelo órgão, como dito neste ensaio.
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